quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Cobras

Diariamente, tropeçamos em cobras!
“Era uma vez uma cobra que começou a perseguir um pirilampo que só vivia para brilhar. Ele fugia rápido, com medo da feroz predadora e a cobra nem pensava em desistir. Fugiu um dia e ela não desistia, dois dias e nada. No terceiro dia, já sem forças, o pirilampo parou e disse à cobra:
- Posso fazer três perguntas?
- Podes. Não costumo abrir esse precedente para ninguém mas já que te vou comer, podes perguntar.
- Pertenço à tua cadeia alimentar?
- Não.
- Fiz-te alguma coisa?
- Não.
- Então porque é que me queres comer?
- PORQUE NÃO SUPORTO VER-TE BRILHAR!!!
E é assim, "Diariamente, tropeçamos em cobras!"
in: http://alvitrando.blogs.sapo.pt/

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Opinião

Solicitado pelo semanãrio "Região de Leiria" a comentar:
A Bíblia é um “manual de maus costumes”, como diz Saramago?

Saramago terá proferido a afirmação em determinado contexto, que não conheço. Como ateu, respeito com normalidade quem da Bíblia faz o seu referencial de vida, que não é o meu, independentemente de me rever em alguns valores aí defendidos. Não me revejo em todo o sobrenatural da criação do mundo em seis dias, com paragem ao sétimo e sem a descrição das “acções” posteriores, ou se as houve. Mais que a “maus costumes”, a Bíblia (o Corão, etc.) tem servido a “más acções”, situando-se preferencialmente contra a luta emancipadora dos povos (“A história de toda a sociedade é a história da luta de classes”). E quem, constituindo excepção, a tem usado na defesa dos “ventres ao sol”, não raras vezes se vê excomungado por uma qualquer “inquisição” de altas hierarquias “rendidas ao fetichismo do capital explorador”.
in Região de Leiria - 2009.10.23

Legislativas 2009

Aproxima-se a data das eleições para a Assembleia da República. A 27 de Setembro vamos eleger deputados. Não vamos eleger um primeiro ministro. O resultado das eleições condicionará a vida política nos próximos anos e definirá o quadro político que servirá de base à formação do governo.
Mas, sabemos realmente quem são os nossos deputados? O hemiciclo que vemos nas televisões é composto por um grande “centrão” (PS e PSD) e por representações parlamentares de outros partidos mais pequenos. As políticas defendidas ou implementadas pelos partidos do “centrão” (PS e PSD), apresentam-se como alternativa um ao outro, mas não se têm distinguido, no essencial, ao longo de trinta e três anos, persistindo numa política de direita que, também nunca é demais sublinhar, conduziu o País à situação dramática hoje existente.
Apoiar as forças do “centrão” significa contribuir para a eleição de deputados empenhados na defesa das políticas de direita dos seus partidos, alguns dos quais deputados-perfeitos-desconhecidos, que mais parecem estar no hemiciclo apenas para votar. É necessário ao País eleger deputados decididamente apostados numa nova política.
É tempo de rotura e de alternativa. E a alternativa começa em cada um de nós, no exercício do direito de voto. Votar bem significa, na minha opinião, dar o voto àqueles que todos os dias se preocupam verdadeiramente com a qualidade de vida e de trabalho dos cidadãos mais humildes, que constituem a esmagadora maioria do povo português; dar o voto aos que estão do lado dos trabalhadores quando as multinacionais encerram as portas das empresas em Portugal, para as abrirem noutros países, contribuindo para a destruição do aparelho produtivo nacional; dar o voto aos que, juntamente com a maioria da população, lutam contra o encerramento dos Centros de Saúde e contra as políticas de privatização da saúde; dar o voto aos que defendem uma Escola Pública, gratuita e de qualidade para todos, com professores motivados e reconhecidos; dar o voto aos que consequentemente se batem contra o Código do Trabalho e contra a submissão total do poder político ao poder económico; dar o voto aos que se batem contra a subserviência aos ditames do imperialismo, do envolvimento em criminosas guerras de ocupação com centenas de milhares de mortos e da venda a retalho da soberania e da independência nacional; dar o voto a quem conhece, estuda e propõe uma verdadeira alternativa.
Como professor e como cidadão voluntaria e decididamente empenhado na construção de uma sociedade mais justa, só posso dar o meu voto a uma força política que ao longo de décadas tem representado a verdadeira alternativa às políticas de direita seguidas ora por uns, ora por outros. É por isso que, convictamente, vou votar na CDU - Coligação Democrática Unitária.
in semanário "Expressões" M. Grande

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Uma sede para o Tocándar

Termina mais um período de trabalho do Tocándar. Desde o início de 2009, foram realizados vinte e dois espectáculos e perto de uma centena de oficinas de percussão. Estendemos a nossa actividade aos jovens de Vieira de Leiria. Chegou o momento de gozar umas merecidas férias. Mas não estamos tranquilos (nunca estamos tranquilos…).
Será pertinente destacar um conjunto de acontecimentos do mês de Julho que, pelo seu significado, fazem este projecto significar algo mais.
No dia 25 de Julho a Associação Tocándar assinou com a Associação CLES do Senegal um protocolo de colaboração, conscientes as duas organizações de que devem cooperar por um mundo melhor.
Na última semana de Julho o Tocándar rumou ao planalto mirandês, onde se viu envolvido num verdadeiro banho de cultura. Por lá, a participação nos concertos e actividades do “L Burro I L Gaiteiro” (“O Burro e o gaiteiro”) e na Feira de Instrumentos Musicais Ibéricos transformaram-se num sucesso! Foi o concerto de lançamento do CD da banda de gaitas Roncos do Diabo, gravado com a colaboração do Tocándar; foi a participação no espectáculo dos Galandum Galundaina, após um fim de tarde de trabalho conjunto para apurar os toques; foram as aulas de pauliteiros, o novo projecto Tocándar; foi o convite da banda espanhola La Musgaña para participação num festival de percussão já no próximo ano e para o desenvolvimento de trabalho conjunto, que pode virar disco; foram os encontros com personalidades destacadas da música tradicional ibérica, como Paco Diez, Luís Delgado, Jorge Lira, etc. Mas o destaque principal vai para a inesgotável capacidade dos jovens do Tocándar de conquistarem as pessoas e fazerem amigos.
A qualidade e profundidade do trabalho desenvolvido contrasta flagrantemente com as condições em que se faz a preparação do projecto. De tambores às costas, saltámos da Escola Calazans Duarte para o Edifício da Resinagem, ninguém sabe se por dias ou por meses. As nossas costas, negras das pancadinhas de parabéns, carregam o peso de uma certa indiferença que corajosamente transformamos em recurso, com que nos armamos para o futuro. Garanto-vos que, de todos os amigos que temos feito por essas terras, ninguém fica indiferente à absurda falta de condições em que trabalhamos. Aos mais distraídos lembramos que várias são as instituições na Marinha Grande que utilizam instalações oferecidas para Câmara Municipal, para o desenvolvimento do seu inestimável trabalho de formação de jovens e de intervenção social. É urgente a criação na Marinha Grande de infraestruturas capazes de acolher projectos do tipo do Tocándar, do Rancho Folclórico, das Orquestras Ligeiras e das Bandas de Garagem. Cabe às autarquias locais, Câmara Municipal e Junta de Freguesia a parte fundamental e decisiva desta responsabilidade. Nós estamos no terreno a intervir. E temos dado provas de reunir as competências necessárias para o fazer. Não podemos continuar a assistir ao tratamento diferenciado de estruturas do mesmo tipo. Não há mais tempo para indecisões. Os apoios financeiros que a Câmara Municipal e da Junta de Freguesia têm prestado, em troca da actividade desenvolvida, são importantes. Mas de uma vez por todas, é urgente encontrar instalações adequadas para o Tocándar! Se o problema são propostas, nós temos várias!
É a dedicação de mais de 700 jovens, apoiados pelas suas famílias, que tem tornado possível o crescimento contínuo deste projecto, que muito nos orgulha.
A partir de Setembro, será possível participar nas actividades do projecto, gratuitamente como sempre, no Parque da Cerca. Convidamos os pais, as mães e os filhos a experimentarem a magia dos tambores. Convidamos todos os jovens a viverem as emoções do trabalho de recriação da música tradicional e das tradições e a possibilidade de integrarem um projecto com projecção internacional.
In jornal "Expressões" da Marinha Grande

terça-feira, 14 de julho de 2009

Tágadágadá - Culturas dos povos

Como eu gostava que a minha terra tivesse, sozinha ou em conjunto com outras, um festival onde se mostrassem as culturas dos povos. Gastronomia, artesanato, música, danças, jogos, tradições seriam rainhas.
Este mundo cada vez mais em rede, cada vez mais globalizado, chama a nossa atenção para aquilo que nos une, que é paradoxalmente aquilo que nos torna distintos, singulares. E na medida em que conhecemos o que é característico de uma determinada realidade geográfica e social, obrigamo-nos a descobrir e valorizar a nossa identidade, na semelhança e na diferença com os outros. Além da riqueza que é conhecermos mais que o nosso meio.
Está a nascer na Marinha Grande um novo conceito: “Tágadágadá – culturas dos povos”. Pela mão do Tocándar e seus amigos pode ser possível concretizar o sonho. Há muito que andamos por esses caminhos, alguns há mais de 25 anos, como o Rancho Folclórico de Picassinos. Há muito que levamos as culturas que os nossos povos fazem a outros povos amigos. A concretização deste sonho é cada vez mais uma necessidade cultural, social e de conhecimento. Trata-se de trazer à nossa terra (e região) o melhor dos diferentes fenómenos culturais com os quais nos vamos cruzando por esse país e pelo mundo. Temos o dever, como agentes da cultura marinhense, de dar a conhecer aos nossos conterrâneos as maravilhas com as quais nos vamos cruzando.
Certamente que o parto é difícil. Mas os sonhos começam assim e depois transformam-se em realidades, que vão contribuir para que nada fique igual.
A nossa terra, com uma localização privilegiada no contexto geográfico do país, com boas acessibilidades e rodeada por uma mata soberba, contém todos os ingredientes necessários para a concretização deste projecto. Além de que uma tal realização seria uma mais valia importante na dinamização do turismo local.
Vamos pois conhecer outros povos, de cá de dentro e lá de fora e fazer novos amigos.
Publicado no jornal "Expressões"

Nota: a realização do primeiro Tágadágadá esteve prevista para fim de Julho de 2009 em S. Pedro de Moel, com a participação de 4 grupos de percussão. A falta de apoios, nomeadamente financeiros, inviabilizou a iniciativa. Mesmo assim não cruzámos os braços e lancámos a iniciativa "outros povos, novos amigos" com "O Dia do Senegal". Ver mais pormenores em www.tocandar.com
É muito complicado tentar promover eventos culturais. Mas, água mole em pedra dura...
Não vamos fazer mais comentários

domingo, 24 de maio de 2009

“Catedral verde e sussurrante”

Os couteiros, carreiros e lenheiros, foram os primeiros marinhenses. As raízes da Marinha Grande, quer como povoação, quer como grande centro industrial, designadamente da industria vidreira, mergulham fundo na existência do Pinhal de Leiria ou Pinhal do Rei D. Dinis.
A festa maior da nossa tradição, o feriado municipal Quinta-feira de Ascensão (Dia da Espiga) faz parte do imaginário de qualquer marinhense e está também associada ao pinhal. Nesse dia, a mata enche-se de gente miúda e graúda, de farnel em riste, à procura de uma sombra ou de um canto sossegado.
Apesar da escapada ecológica (e gastronómica) deste dia, existe, em meu entender, um deficit de empatia entre os marinhenses e a sua mata. Cabe à família, à escola e às autarquias o papel de rapidamente darmos passos no sentido da inversão definitiva desta constatação.
Em diversas ocasiões tenho manifestado a ideia de que com pouco investimento e alguma imaginação, seria possível criar nas Pedras Negras um “Centro de Animação e Interpretação Ambiental”. Este Centro seria de responsabilidade municipal, destinado a promover a educação ambiental e a criação de um corpo de vigilantes da floresta.
Durante o ano lectivo, caberia à Protecção Civil e aos Bombeiros a responsabilidade de dinamizarem, nas escolas e nas colectividades, um trabalho de sensibilização e formação, que teria como corolário um “estágio” prático em acampamento, onde seriam desenvolvidas actividades de usufruto e preservação da mata. Seria também uma oportunidade excelente para captação de novos elementos para integrarem as fileiras dos soldados da paz. Isto para além das enormes potencialidades existentes no currículo oculto de uma actividade deste género.
Neste tempo em que todos tendemos a ser mais ecológicos, por necessidade imperiosa de sobrevivência, bom seria que quem tem o poder e os meios, assumisse a sua responsabilidade. Não seriamos hoje couteiros ou lenheiros. Mas seriamos certamente cidadãos mais bem formados e preparados para o futuro.
Então provavelmente ganhariam outro sentido as palavras do poeta Afonso Lopes Vieira, escritas em homenagem ao Pinhal do Rei:

Catedral verde e sussurrante, aonde
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o "Lavrador" que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim...

(Publicado em "Expressões" 2009.05.23)

domingo, 5 de abril de 2009

O futuro constrói-se

Recentemente, foi aprovada na sessão distrital do “Parlamento dos Jovens” um Projecto de Recomendação à Assembleia da República apresentado por jovens da Escola Secundária Calazans Duarte. Sendo professor nesse estabelecimento de ensino, muito me honra que o mérito destes nossos alunos tenha sido reconhecido. A proposta consistia na “criação de uma Assembleia Municipal de jovens onde estes possam expor livremente as suas ideias sobre as políticas conduzidas pelas autoridades e, ao mesmo tempo, questionarem e debaterem temas de interesse e impacto social.”Sou particularmente sensível a esta temática. Há muito defendo em teoria e na minha prática o envolvimento dos jovens (e das crianças) no fenómeno social. Em teoria, tenho defendido a criação de uma Comissão Municipal da Juventude verdadeiramente representativa e interventiva. Na prática, tenho procurado implementar, na profissão e nos projectos que desenvolvo, diversas formas de democracia representativa e participativa. O caminho nunca é fácil e isento de espinhos. Mas garanto que a experiência vale a pena.
É urgente construir um modo novo de pensar a nossa cidade. E este modo novo tem de ser construído na base do envolvimento dos mais jovens e no cruzamento das suas expectativas com as experiências dos avós.
Não basta erguermos permanentemente o bastão punitivo sobre as cabeças das gerações mais jovens e classificá-las de incapazes, distraídas e prevaricadoras. É preciso criarmos condições para a revelação das inúmeras capacidades escondidas ou adiadas que habitam cada um dos que encontramos todos os dias nos pátios das escolas ou nas empresas. Mas para isso tem de haver políticas: a nível nacional e a nível local.
A meu ver o eixo central passaria pela criação de uma Comissão Municipal da Juventude, criação de Centros de Apoio às Actividades Juvenis e utilização dos edifícios sede das colectividades como autênticos Centros de Recursos para intervenção na sociedade. Aqui se juntaria a intervenção de Mediadores e Animadores, associados a projectos existentes ou a criar na nossa terra.
Aos mais interessados nesta problemática recomendo, entre outras, a leitura da obra “La ciudad de los niños” de Francesco Tonucci, investigador do Instituto de Psicologia do Conselho Nacional de Investigação de Roma.
Existem propostas e ideias. É urgente agirmos sem termos receio de sermos “acusados” de dar demasiado poder aos jovens. Afinal, são eles o futuro. E o futuro constrói-se.
(Editado no semanário "Expressões" do dia 17 de Abril)

domingo, 8 de março de 2009

“Rede de Ideias, Projectos e Artes”: partilhar experiências e sonhos

A Marinha Grande foi desde sempre uma terra com iniciativas culturais, que progrediram ao mesmo tempo que as suas gentes e as gentes que aqui chegaram foram “misturando” os traços identitários das suas terras de origem. De “povoado de couteiros e lenheiros”, a Marinha Grande transformou-se em terra de vidreiros, com oficiais trajando de casaca e cartola e que aprenderam as letras, as contas e as artes da representação pela mão de mestres contratados pelos Irmãos Stephens. Podemos falar de uma população com conhecimentos e necessidades culturais. É certo que nem sempre muito evidentes, mas que ainda assim, ao longo dos anos, tem gerado e acarinhado diversos projectos. Este é um legado histórico que importa potenciar, num país e num mundo cada vez mais analfabeto e “formatado” pelas “ideias dominantes”.
Como forma de resistir e avançar, mobilizando o maior número possível de activistas culturais, nasceu a Rede de Ideias, Projectos e Artes (RIPA) da Marinha Grande, que deu os seus primeiros passos em Junho de 2001, com a realização em Picassinos do espectáculo “Quem sai aos seus”, no qual estiveram envolvidos o Tocándar, o Rancho Folclórico de Picassinos, a Orquestra Ligeira da Marinha Grande, a Fanfarra dos Bombeiros Voluntários da M. Grande e o Grupo Reviver o Passado da Praia da Vieira. Hoje estão envolvidos na RIPA, para além dos projectos citados, mais de uma dezena de artesãos, a Orquestra da Amieirinha, o Grupo de Teatro da ASURPI e alguns outros projectos e associações. A RIPA tem como objectivos principais: a defesa da identidade de cada projecto integrante, a organização e realização de actividades conjuntas e a partilha de experiências entre os projectos envolvidos. Existe aliás na nossa sociedade um enorme campo de crescimento na cooperação entre associações e colectividades (criação de um concelho das colectividades e do desporto) e nas IPSS’s, conduzindo a ricas possibilidades de colaboração entre umas e outras, com enormes vantagens para a qualidade do trabalho desenvolvido e dos efeitos alcançados.
Não existe ainda na Marinha Grande um equipamento de qualidade para a realização de eventos culturais, mas existem muitas sedes de colectividades, autênticos centros de recursos deficientemente aproveitados e existem diversos projectos capazes de pôr as coisas a mexer.
No panorama cultural da Marinha Grande, a RIPA propõe-se intervir, agitar e promover a partilha. Visitem-nos em www.ripamg.com.sapo.pt
(Editado no semanário "Expressões")

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Tocándar: nove anos

Estamos cá e comemoramos nove anos de vida. Editámos dois CD’s e dois DVD’s. Realizámos 384 espectáculos em todo o país e no estrangeiro. Centenas de jovens e menos jovens tiveram a possibilidade de participar em centenas de oficinas de percussão, dezenas de acções de formação (construção de cabeçudos e gigantones, aprendizagem de flauta de tamborileiro, aprendizagem de gaita de foles, exploração de caretos, etc.), conferências internacionais e intercâmbios com projectos nacionais e estrangeiros. A partir de um projecto de escola, fundámos uma associação reconhecida por diversos parceiros como uma estrutura dinâmica e inovadora. A nossa experiência deu já origem a outros projectos no país (continente e ilhas) e teve forte influência em projectos amigos noutros países. Não param de chegar propostas para participação em eventos de grande qualidade por todo o mundo. Só o ano passado estivemos em dois eventos de grande prestígio no estrangeiro – Expo Zaragoça e Festival da sidra em Nava – Oviedo. Tudo isto é produto do trabalho de gente da nossa terra. Muitos jovens que, apesar das limitações impostas pela vida escolar, entendem merecer a pena, semana após semana, empregarem o seu tempo na recriação das tradições portuguesas. Fomos obrigados a deixar de ser apenas “projecto de escola” para sermos, além de “projecto de escola”, também “associação”. Foi talvez a melhor forma de conseguirmos continuar e progredir. Apesar de diversas “incompreensões”…
Tudo muito bem. Tudo muito bonito. Tudo correndo sempre no combate contra os problemas normais que acontecem na vida das pessoas e das instituições. Sempre procurando transformar as dificuldades em recursos.
O que não consigo compreender é que, nove anos depois e apesar das palmas e das palmadinhas nas costas, as condições de trabalho continuem a ser as mesmas. Entenda-se, as mesmas miseráveis condições de trabalho. A Escola Secundária Eng. Acácio Calazans Duarte fornece instalações e, apesar do esforço, provavelmente já não é local que comporte a dimensão do projecto. Não haverá na Marinha Grande local onde se possa alojar um projecto com esta envergadura e abrangência? Não será justo levar esta experiência ao conhecimento e ao usufruto das centenas de crianças e jovens da nossa terra? Para cada uma destas questões, tenho resposta e estou pronto a partilha-la.
Ao iniciarmos a construção do nosso décimo ano de existência, queremos comprometer-nos a não deixar morrer o sonho. Vamos trabalhar mais e melhor, abrindo novas frentes de trabalho e dando corpo a novas ideias. E vamos perseguir os nossos objectivos mais imediatos: atrair mais gente, melhorar o espectáculo para gravarmos um novo DVD e conseguir uma sede!
(Editado no semanário "Expressões")

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

“Lacraram a nossa mãe”

“No primeiro dia de Janeiro de 1934 entrava em vigor o Estatuto do Trabalho Nacional que tinha por modelo a «Carta del Lavoro» de Mussolini e decretava a ilegalização dos sindicatos livres. A classe operária reagiu de imediato. Ao apelo das organizações sindicais, no dia 18 de Janeiro de 1934 desenvolveu-se no país uma greve de características insurreccionais. Em Silves, em Coimbra e nas zonas operárias de Lisboa, no Barreiro e em Setúbal registam-se acções grevistas e manifestações. Mas foi na Marinha Grande que a greve alcançou maiores proporções. A greve, encabeçada por militantes comunistas (José Gregório, António Guerra e outros), teve a adesão maciça dos trabalhadores, que ocuparam a vila durante várias horas.”
Um texto como este pode ler-se em diversas edições comemorativas da jornada heróica de 18 de Janeiro de 1934. Ainda pequeno, ouvi a história contada por meu pai, que a tinha ouvido de seu pai e que a seu tempo contarei aos meus filhos, para que a memória não arrefeça.
Para além da descrição do contexto histórico e dos motivos que levaram ao Movimento e das consequências e contribuições que viria a dar para luta que a seguir se desenrolou, aprendi nessas conversas uns versículos, que eram o texto de uma canção escrita pelo meu tio avô Júlio Marques, logo depois do encerramento do sindicato e da prisão de alguns trabalhadores. Essa canção, desconhecida ainda hoje do grande público, cantava-a o meu avô João Tojeira enquanto se dedicava ao trabalho com o carro da vaca. Logo a começar dizia: “E nunca desanimai / Que um castelo também cai / À vingança hão-de chegar. / Lacraram a nossa mãe / Que tantos filhinhos tem / Que se andam a abraçar.” Mas é o verso mais à frente que me faz meditar no que fomos, no que somos e no que temos de resistir e lutar para ser. E diz assim: “A nossa solidariedade / É um gesto de humanidade / Que bonito que é a união. / Que do pouco que ganhamos / Com todo o gosto pagamos / Para os camaradas sem pão.” Apesar da miséria em que viviam, os trabalhadores vidreiros cotizavam-se para acudirem às mulheres e aos filhos dos camaradas na prisão. Na sociedade em que hoje vivemos, onde nos querem impor o modelo neoliberal e individualista, temos que manter vivo o espírito solidário, que é a nossa raiz e foi o nosso leite de berço. O ser humano é um ser eminentemente social. Combater o sentido social e solidário da nossa existência é lutar contra a nossa identidade. E um povo sem identidade é um povo perdido.
Para mim, esta é outra lição importante que nos deixaram os que em 34 tentaram mudar o rumo à história.
Dizia-nos Júlio Marques na despedida: “Nós temos de triunfar / Nada de desanimar / Nunca deixar a fileira. / Nas fábricas tocam apitos / Operários bradam aos gritos / Avante massa vidreira!”
Um dia, havemos de cantar todos juntos!
(Editado no semanário "Expressões")